A beata Jacinta Marto (1910-1920), a mais pequena das videntes de Fátima,
é um exemplo admirável da criança evangélica, isto é, de uma pequena
criatura em quem brilham de modo admirável os dons e as maravilhas de
Deus. Já por natureza, como testemunha a prima Lúcia, “tinha um coração
muito bem inclinado, e o bom Deus tinha-a dotado dum carácter doce e
meigo, que a tornava, ao mesmo tempo, amável e atraente”. Gostava de
brincar, de contemplar as estrelas, de colher e oferecer flores, de cantar e
dançar, o que não perdeu após as Aparições. Tinha também os seus caprichos
e amuos infantis, que foi superando com as graças do Céu.
Tendo sido agraciada com as aparições do Anjo e da Virgem Maria,
deixou-se cativar pela beleza e bondade dos mensageiros do Céu e penetrar
pelo encanto do amor e da graça que deles recebeu. Depois de ver
pela primeira vez a “Senhora mais brilhante do que o sol”, com o coração
a rebentar de alegria, não se conteve sem revelar à mãe o segredo que se
comprometera a guardar juntamente com o irmão e a prima, e exclamou:
“Ó mãe, vi hoje na Cova da Iria Nossa Senhora!”. A partir de então, a boa
notícia não mais parou. Por esta fragilidade, difundiu-se em todo o mundo
a oferta da misericórdia divina que a Mãe de Cristo veio comunicar aos homens,
fazendo-lhes o apelo a não ofenderem mais a Deus, que já está muito
ofendido.
A experiência das Aparições marca profundamente a pequena Jacinta,
que, com apenas sete anos, sente o impulso forte a amar. E fá-lo com grande
generosidade. Antes de mais, o amor a Deus e a Jesus, quer na sua presença
eucarística, quer na imagem e símbolo do seu Coração. Reconhece
que Jesus é muito bonito, mais do que as estampas em que é representado.
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Mesmo assim, manifesta o seu afecto beijando uma que a prima lhe deu.
Desejava muito receber Jesus na eucaristia, o “Jesus escondido”, como lhe
chamava. E dizia: “Gosto tanto d’Ele!”. Visitava-O na igreja paroquial e não
se cansava de lhe dizer que O amava. Quando a prima regressava da igreja
e lhe dizia que tinha comungado, pedia-lhe com grande ternura: “Chega-te
aqui bem para junto de mim, que tens em teu coração a Jesus escondido”.
Ela tinha uma real percepção da presença de Jesus no seu íntimo, embora
não soubesse explicar bem o que experimentava. Dizia: “Não sei como é!
Sinto a Nosso Senhor dentro em mim. Compreendo o que me diz e não O
vejo nem oiço; mas é tão bom estar com Ele”. Tinha dentro do peito um fogo
ardente que a levava a amar Jesus e o seu Coração. Muitos dos sacrifícios
que sofria oferecia-os por amor de Jesus e de Maria. Detinha-se longamente
a pensar em Nosso Senhor e em Nossa Senhora, nos pecadores...como
forma de meditar e de lhes manifestar o seu afecto. Enquanto esteve no
Orfanato, em Lisboa, podia fazer companhia a Jesus escondido e receber
a comunhão.
Nada menos era o seu amor à Virgem Maria, especialmente sob a imagem
do seu Coração Imaculado. Exclamava: “Eu gosto tanto do seu Coração!
É tão bom!”. Pouco antes de ir para o hospital, recomenda à prima
que difunda a sua devoção: “Diz a toda a gente que Deus nos concede as
graças por meio do Coração Imaculado de Maria; que lhas peçam a Ela; que
o Coração de Jesus quer que, a Seu lado, se venere o Coração Imaculado
de Maria; que peçam a paz ao Imaculado Coração de Maria, que Deus lha
entregou a Ela”. O seu amor e devoção manifestava-se quer no cumprimento
das recomendações e apelos da Virgem quer na oração frequente
do rosário. E ainda na repetição frequente das jaculatórias: “Doce Coração
de Maria, sede a minha salvação! Imaculado Coração de Maria, converte os
pecadores, livra as almas do inferno!”.
A salvação dos pecadores foi a grande paixão da sua vida, como reconheceu
o Papa João Paulo II, na homilia da missa da beatificação, em Fátima,
no ano 2000: A pequena Jacinta sentiu e viveu como própria a aflição
de Nossa Senhora pelos seus filhos que se perdem por não haver quem se
sacrifique e peça por eles. Por isso, ofereceu-se “heroicamente” como vítima
pelos pecadores. Um dia - já ela e Francisco tinham contraído a doença
que os obrigava a estarem na cama - a Virgem Maria veio visitá-los a casa,
como conta a pequenita: «Nossa Senhora veio-nos ver e diz que vem buscar
o Francisco muito em breve para o Céu. E a mim perguntou-me se queria
ainda converter mais pecadores. Disse-lhe que sim». E, ao aproximar-se
o momento da partida do Francisco, Jacinta recomenda-lhe: «Dá muitas
saudades minhas a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e diz-lhes que sofro
tudo quanto Eles quiserem para converter os pecadores». Jacinta ficara tão
impressionada com a visão do inferno durante a aparição de 13 de Julho,
que nenhuma mortificação e penitência era demais para salvar os pecado13
res. Bem podia ela exclamar com São Paulo: «Alegro-me de sofrer por vós e
completo em mim próprio o que falta às tribulações de Cristo, em benefício
do seu Corpo, que é a Igreja» (Cl 1, 24).
O amor à família era constante, bem como à prima e companheira da
aventura espiritual. Exprimia-o com vários gestos de ternura, como a oferta
de flores, a oração e o sofrimento que experimentava quando estava afastada
dela. A despedida para Lisboa, que sabia ser definitiva, custou-lhe muito
e fê-la chorar. Só a certeza de que estava a cumprir as palavras de Nossa
Senhora e a oferta de mais um sacrifício por amor atenuava a sua pena.
Ouviu um sacerdote falar do Santo Padre e recomendar a oração por
ele. Associado a isso, teve uma visão em que o via em sofrimento, insultado
por muitas pessoas. A Jacinta adquiriu então um grande amor pelo Papa e
desejava muito que viesse a Fátima. Quando a proclamou beata, João Paulo
II expressou-lhe publicamente a sua gratidão “pelos sacrifícios e orações
oferecidas pelo Santo Padre”. Também os sacerdotes mereceram particular
atenção e afecto da vidente. Se é certo que os interrogatórios de alguns a
incomodavam e deles fugia, encontrou outros que lhe deram conselhos e
ensinamentos que seguia com diligência. Quando, em Lisboa, se foi confessar,
saiu consolada do Sacramento e manifestava o seu contentamento,
exclamando: “Ai, mãe, que Padre tão bom, que Padre tão bom!...”. Nessa
ocasião, recomendava a oração pelos sacerdotes e dizia que eles “só deviam
ocupar-se das coisas da Igreja”, que deviam “ser puros, muito puros”
e que a sua desobediência aos seus superiores e ao Santo Padre ofendia
muito a Nosso Senhor.
Ela, que se prendia às suas coisas e gostava de atrair a atenção sobre si
mesma, após as Aparições, tornou-se desprendida e generosa. Tomou a iniciativa
e arrastou os companheiros para darem a própria merenda às outras
crianças pobres. E fazia-o “com tanta satisfação, como se não lhe fizesse
falta”. Tomou tão a sério a prática do sacrifício para oferecer pela conversão
dos pecadores que se tornou insaciável. Não lhe bastavam os que a vida
já lhe trazia, procurava outros modos de se sacrificar, que hoje podemos
achar exagerados e mesmo perigosos para a sua saúde. O seu amor apaixonado
tornou-se desmedido para alcançar a salvação dos pecadores. Mas
manifestava-se também na compaixão com as pessoas em sofrimento e
na oração com eles, obtendo-lhes as graças do Céu, pela sua intercessão.
Encara os sofrimentos como missão, oferecendo tudo a Jesus, por amor
a Ele, em reparação pelos pecados contra o Imaculado Coração de Maria,
pela conversão dos pecadores e pelo Santo Padre. Na doença, recebe de
novo a visita da Virgem Maria que lhe revela o que ainda deveria passar e
que a iria buscar para o Céu. Assim encontrava consolação e coragem para
tudo suportar. Às vezes beijava um crucifixo e, abraçando-o, dizia: “Ó meu
Jesus, eu Vos amo e quero sofrer muito por Vosso amor”. O médico que a
operou, em Lisboa, testemunha a sua impressão de que se deparou com
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“uma criança com muita coragem”, que deu prova de grande heroísmo no
quanto sofreu e no modo como o suportou. Nos últimos dias da sua breve
vida, Nossa Senhora apareceu-lhe e disse-lhe que lhe tirava as dores. E, de
facto, aliviada do sofrimento, falava e distraía-se à vontade, nomeadamente
vendo estampas religiosas.
Ao partir para Lisboa, na última fase da doença, sofre imenso e tem
consciência da proximidade da morte, mas conforta-a a promessa de que
iria para o Céu. Ali teria ocasião de “amar muito a Jesus e o Imaculado
Coração de Maria” e de pedir muito pelas mesmas intenções que tinha em
vida: os pecadores, o Santo Padre, os seus familiares e as pessoas que a
ela se encomendaram. Consolava a mãe, dizendo-lhe: “Não se aflija, minha
mãe: vou para o Céu. Lá hei-de pedir muito por si”. Faleceu, tranquilamente,
sozinha, como Nossa Senhora lhe tinha predito.
Sobre ela e seu irmão Francisco, o Papa João Paulo II, na referida homilia,
formulou o voto de “que a mensagem das suas vidas permaneça sempre
viva para iluminar o caminho da humanidade!” E disse que ambos se entregaram
“com total generosidade à direcção de tão boa Mestra (a Virgem
Maria) que subiram em pouco tempo aos cumes da perfeição”. Por isso,
louvou assim a Deus, dizendo:
«Eu Te bendigo, ó Pai, porque escondeste estas verdades aos sábios e
inteligentes, e as revelaste aos pequeninos». Eu Te bendigo, ó Pai, por todos
os teus pequeninos, a começar na Virgem Maria, tua humilde Serva, até aos
pastorinhos Francisco e Jacinta.
P. Jorge Guarda
Fonte site Santuario de Fátima.
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